Pegadinhas em avaliações educam a atenção do aluno?

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Ministrando oficinas de elaboração de itens para professores, costumamos desestimular fortemente o uso das chamadas “pegadinhas” em avaliações. Entretanto, mais de uma vez, ouvimos de professores que as pegadinhas são expedientes usados por eles para que os alunos aprendam a prestar atenção aos detalhes dos enunciados. Com isso, esses professores pretendem preparar os alunos para provas externas, tais como vestibulares.

Este pequeno texto é uma tréplica a esse tipo de argumento. Então, desde já reafirmamos nossa tese: as pegadinhas em avaliações devem ser fortemente evitadas. Vejamos porque.

Em primeiro lugar, está em jogo a validade do item de avaliação, que é um dos conceitos mais importantes no campo da Avaliação Educacional. Diz-se que um item de avaliação é válido se realmente é capaz de avaliar a habilidade pretendida. Isso significa que deve ser possível fazer inferências acerca da habilidade do aluno a partir de sua resposta a um item válido: se ele erra, gostaríamos que fosse porque ele não detém tal habilidade e, se acerta, porque a detém.

Vejamos um exemplo de como uma pegadinha pode afetar a validade de um item.

Digamos que um determinado item de avaliação pretende avaliar a habilidade de resolver um problema de otimização, a partir de uma função quadrática, em um contexto extra matemático.

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Ainda que o aluno detenha a habilidade explicitamente requerida para resolver o problema – o que envolve deter os conhecimentos necessários e saber mobilizá-los frente ao problema -, ele ainda pode errar o item, se ignorar o detalhe de que o enunciado pede não a produção que maximiza o lucro (55), mas seu dobro (110). Isso não significa que a atenção aos detalhes não é importante, mas a pegadinha está no fato de que o detalhe é periférico e escapa ao sentido geral do problema (qual é o propósito de perguntar sobre o dobro?). Além disso, apresentar o 55 entre as alternativas atrai de modo quase malicioso a atenção do aluno que chegou correta e coerentemente a esse número.

O resultado objetivo, obviamente, é o comprometimento da validade do item: o aluno que detém a habilidade pretendida é identificado com aquele que não a detém, fazendo com que o item perca seu poder de discriminação. Além disso, convém se perguntar: qual é o efeito subjetivo desse tipo de expediente? Sim, a mensagem é que se precisa prestar muita atenção… Mas também é a de que a habilidade e o conhecimento originalmente exigidos valem pouco diante das avaliações escolares. 

 

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Aline dos Reis Matheus

Diretora Educacional da Academia Primeira Escolha

 

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