Por Tadeu da Ponte em 23/01/2018 14:15:00
Na lógica do direito, contraprova é uma “prova cujo teor contraria ou anula uma prova apresentada anteriormente”. Nada mais etimológico. Vamos imaginar o nosso cérebro como um tribunal, na qual a entidade que representa a parte mais isenta de nós é o juiz. Mas, nesse tribunal não há exatamente um réu, mas sim uma ideia ou afirmação sobre a qual queremos avaliar sua veracidade.
Vamos supor por um momento que a ideia em julgamento é a seguinte: “este é um ótimo candidato para esta área, gostei dele!”. Agora suponha que haja dois advogados ali dentro da nossa massa cinzenta, um que defende esta ideia e o outro que a refuta. Quando fazemos o famoso raciocínio confirmatório, nós praticamos uma verdadeira seleção de evidências deixando apenas o advogado de defesa falar e apresentar provas.
Se queremos uma pessoa com uma boa competência de tomada de decisão, perguntamos ao candidato algo relacionado a esta competência, numa entrevista por competências, ouvimos tudo que o candidato fala, mas escutamos realmente apenas as evidências que ele fornece que confirmam a nossa hipótese que é, neste caso, a seguinte: “o candidato tem ótima tomada de decisão”. Isso se agrava quando gostamos do candidato por qualquer outra razão. Essa diferença entre os verbos ouvir e escutar é crucial para a discussão que se coloca em pauta. Se nossos ouvidos são saudáveis, ouvimos todos os sons que fazem vibrar as membranas dos nossos tímpanos, mas escutamos apenas aquilo a que atribuímos algum significado.
Procurar apenas as informações que confirmam a nossa hipótese é classificado pelos estudiosos do pensamento como um viés cognitivo, ou simplesmente, viés de confirmação.
Comandos como: “conte-me uma situação em que você precisou tomar decisões importantes”, “conte-me outra em que você tomou decisão sob pressão”, “você se lembra de alguma decisão que teve que tomar que tinha grande impacto na vida de outras pessoas?”, “teve alguma situação em que você tomou decisão em uma situação complexa?”, “você já tomou alguma decisão que confrontou sua diretoria?”. Todas essas perguntas foram formuladas pelo advogado de defesa, o outro sequer teve chance de refutar. O candidato não irá mentir, não é essa a questão. Mas, é muito provável que ele, pensando um pouco, lembre de um caso para contar para cada comando dos exemplos anteriores. É fato que podemos aprender muita coisa sobre o candidato com essas respostas, mas e se o candidato tem dificuldade em tomar decisões em 95% das vezes e conta as únicas 5 histórias bem-sucedidas das 100 em que ele precisou decidir?
O mesmo acontece quando antipatizamos com um candidato: selecionamos perguntas e, delas, as respostas que confirmar para nós que o candidato não serve.
Nos dois casos, devemos procurar por contraprovas:
- das situações em que você precisa tomar decisões importantes, quais são as mais difíceis para você?
- você já lidou com as consequências de uma decisão não tomada? como isso aconteceu?
- que tipo de decisão é mais difícil para você tomar?
- você já tomou uma decisão pouco popular? foi mais difícil tomar a decisão ou comunicá-la?
Perguntas abertas também podem ser ótimas aliadas dos dois advogados:
- nas suas viagens de férias, quem escolhe os lugares e passeios?
- você prefere um salário maior do que você ganha no seu atual emprego por um ano nessa área ou entrar com o mesmo salário que você tem hoje, mas com chances de crescer muito mais naquela outra?
- quais são os principais fatores para você decidir vir para esta companhia caso eu lhe faça uma proposta de emprego?
Para cada resposta, lembre-se: a seleção de evidências é o caminho para uma terrível barreira de pensamento, o viés de confirmação. As contraprovas, se intencionalmente procuradas, podem funcionar como uma verdadeira cirurgia para correção de miopia cerebral.
Tadeu da Ponte
CEO da Primeira Escolha